sábado, 12 de julho de 2014

A linha de chegada do Ironman Florianópolis 2014

Olhando meu quadro (virtual) de medalhas, eu já contabilizo 192 chegadas, desde passeios ciclísticos até maratonas e uma ultra. Tem também alguns triathlons, duathlons, aquathlons e um meio Ironman. Se mostrar a medalha eu lembro da prova imediatamente, mas nada se compara à linha de chegada de um Ironman.

Então estava eu lá, no Km 41, onde passava de tudo pela minha cabeça, mas alguns detalhes precisavam de atenção imediata. Enquanto algumas pessoas ainda estavam pelos arredores dando os parabéns para os atletas (sim, incrível!) eu tive um pensamento inusitado: “tripulação, preparar para o pouso!”. Acho que disse em voz alta, mas ninguém ouviu, com certeza.

Passei por um outro atleta e disse “caramba, esse é o quilômetro mais longo da minha vida, não chega!”. O cara concordou e ficou um pouco para trás, enquanto eu arrumava os últimos detalhes para depois da curva, entrar no Clube 12 novamente (local da expo e retirada dos kits, além de área de transição) e bom, sei lá qual seria a sensação. Na verdade eu tinha apenas um detalhe a ajustar: carreguei durante os 42 Km uma homenagem simbólica à alguém que sempre inspirou atletas e esportistas pequenos, grandes ou mesmo minúsculos como eu. A faixa enrolada saiu da pochete e eu tentei erguer o melhor que pude para passar a linha de chegada, com esta incrível mensagem do campeão:


Valeu Ayrton, obrigado pela inspiração!

Do outro lado do pórtico o locutor anunciava, ao ver que eu carregava alguma coisa: “Lá vem mais uma chegada animada!”. Passei o pórtico com o relógio oficial da prova marcando 15:52:51, enquanto o locutor completava: “Claudio Nascimento Rinaldo, você é um Ironman!”. Por mais que você tente nos meses que antecedem a prova imaginar como seria incrível
ouvir aquilo, não tem como descrever. Abaixei a faixa, fui recepcionado por alguém do staff que colocou uma tolha nas minhas costas e virei na direção dos fotógrafos oficiais que queria mais uma foto.

Não houve um direcionamento muito bom nesta hora e a primeira tenda na verdade era a de retirada de kits, que virou uma enorme mesa de comes e bebes. Peguei alguma coisa para conseguir parar em pé e fui buscar o kit pós-prova. A voluntária cortou um pedaço da fita de identificação sinalizando que eu já havia recebido o kit e recebi minha camiseta G (ufa, desta vez não faltou!). E ela, algo pequeno, feito de latão e fita de cetim com um pouco de verniz colorido para destacar o logotipo, mas que tem um valor inestimável:


Mais fotos e fui para a tenda de troca pegar minhas sacolas, onde tive o prazer de conversar com o Sr. Kenneth, um americano que havia concluído a prova alguns segundos antes que eu. Sua faixa etária: 70-74 anos! E ele ainda me contou que fazia isto há 30 anos, e que estava ali para uma vaga em Kona no Havaí! O que se pode dizer de uma pessoa como estas, quanta inspiração ele transmite? O mínimo é o que eu disse pessoalmente e deixo registrado aqui: “Congratulations, Mr. Kenneth!”.

Fui buscar a bike, que ainda estava na companhia de algumas outras na área de transição. Ao sair, um membro do staff conferiu meu número com a plaquinha da bike e pediu para que eu olhasse para a câmera no alto da tenda. Nota 1000 para a segurança, que além deste aparato ainda contava com diversos agentes engravatados por perto, afinal, algumas daquelas magrelas custam mais que um carro.

E assim termina esta jornada. Do momento da inscrição, com o estômago revirando de nervosismo até aquele momento foram 11 meses e meio de treino e muitos problemas. Como eu não vivo de esporte, tudo isto teve que ser encaixado na rotina de trabalho e vida pessoal, motivo que também explica porque demorou tanto para concluir estes posts. No final, temos os seguintes números (aproximados, naturalmente):

Natação: 100 Km, 51 horas
Bike: 1.930 Km, 89 horas
Corrida: 1.055 Km, 125 horas
Musculação: 31 horas
Rolo e Bike ergométrica: 28 horas
Outros esportes: umas 6 horas


Isto explica porque eu sofro na bike, é a disciplina onde eu tenho menos treino (por falta de oportunidade na cidade grande) e é claro, a musculação que eu nunca levo a sério.

Se quiser, pode somar à isto tudo um procedimento operatório simples que exigiu alguns dias de molho e um tremendo tombo de bike onde fui ejetado do selim. E é claro, pelo menos 9 horas por dias dedicadas ao escritório, de segunda à sexta-feira. Nada contra ter um treinador ou assessoria esportiva, mas eu não tenho como me adaptar à planilhas inflexíveis no meu dia a dia inflexível.

Também exigiu perder 13 Kg, os quais pretendo não encontrar novamente. Minha alimentação foi revisada, meu sono teve que ser regulado e eu precisei dizer “não” para as gôndolas de pão de queijo e guloseimas no supermercado.

Ah, e tem os números da prova:


Então, fiz meu Ironman, terminei dentro do tempo limite e inteiro. Quer dizer que agora vou sossegar e me dedicar a coisas mais simples, como corridas de 10 Km que adoro, ir para a piscina só para passar o tempo com algumas braçadas e rodar com bike aos domingos só no meu bairro...

Vai nessa. Quem me conhece sabe que eu já devo ter mais uma doideira planejada, e em breve...



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sábado, 5 de julho de 2014

Ironman Florianópolis 2014: parte 3, a corrida

Ou melhor: a Maratona! A logística toda do triathlon, as transições, a mudança de uma modalidade para outra, tudo isto já é bem desgastante, agora imagine ter pela sua frente os temidos 42.195 metros (vulgos 42K) de uma maratona. Seu dia começou lá atrás, acordou às 04:00 da manhã, chegou ao local da prova perto das 05:30, largou às 07:00, já nadou 3,8 Km e pedalou 180 Km. Mas para acabar bonito, precisa enfrentar o último “monstro” do dia.

E lá estava eu na T2, em muitos momentos do treinos imaginava que não veria aquela tenda de troca e pegaria minha sacola, pois como disse antes, muita coisa pode dar errado na etapa do ciclismo. Felizmente poucas situações foram preocupantes, sendo a única “baixa” as minhas costas que doíam pra valer. Assumo o erro, foi posicionamento errado na bike, aliado à natação nervosa e é claro, um pouco mais de condicionamento físico para aguentar aquele tranco todo. De novo joguei o conteúdo da sacola de transição no chão e começa a transformação: tira sapatilha e capacete, troca camiseta segunda-pele e meias, lente escura do óculos pela clara, já que a corrida ia entrar na noite e calçar o tênis.

Saí da tenda de transição após uns 10 minutos e vi uma mesa cheia de guloseimas, um verdadeiro banquete. A mocinha do staff sorridentemente anunciava: “água, Gatorade, bolo...”. Dei marcha a ré, peguei alguma coisa para beber e um generoso pedaço de bolo. Ela riu da minha “fome” e quando acabei de detonar a iguaria, disse “não conte para a minha nutricionista!”. A resposta foi “ah, hoje pode!”. Saí para a corrida e o cadarço elástico do tênis parecia meio frouxo... e quem disse que eu conseguia abaixar? Com as costas doendo, a cara de sofrimento deve ter sido bem feia, uma pessoa que passava ao lado da grade disse: “deixa que eu amarro pra você!”. Mas além de não pode receber ajuda externa na prova sob risco de desqualificação, só agradeci e
puxei o que dava. E pensar que já chamei estes cadarços elásticos de “frescura de triatleta”, paguei minha língua ali.

O impressionante do início da maratona do Ironman Florianópolis não é apenas o visual das mansões de Jurerê, mas todo o povo que está lá te aplaudindo, lendo seu nome no número de peito e te dando incentivo, como se você fosse o primeiro lugar da prova! Até o final da Av. dos Búzios muito incentivo e palavras animadoras, depois disso a coisa fica chata. O percurso neste ano sofreu uma alteração devido ao trânsito, e as temidas subidas de Canasvieiras ficaram logo para o Km 4. Já estava decidido a andar neste trecho e quando vi a inclinação e os atletas que já desciam no sentido contrário só com a força da gravidade, não tive dúvida, aqui será um trecho lento.

E de novo animação: um grupo de pessoas abriu a garagem e com som no último volume saudava os atletas. Para completar, jogavam uma corda lá na frente da subida e o atleta que pegava era “puxado” (de brincadeira, naturalmente) para cima. Na volta, o mesmo grupo ainda bagunçava na rua, incentivando os corredores. Ao som de “Titanium” (David Guetta / Sia), passei por eles com os braços levantados do tipo “balada insana”. Como diz a letra da música “You shoot me down but I won't fall, I am titanium!”, e vou ter que ser de titânio mesmo, só foram uns 13 Km até agora...

Uma percurso de corrida de triathlon ou mesmo de uma prova de Ironman nem sempre é pensado em prover o melhor visual turístico para o atleta, mas no caso desta prova ele é especialmente sem
graça na maior parte do tempo. Passa-se novamente por algumas mansões em Jurerê e pega-se alguns trechos de ruas tranquilas, mas o pior são os chatíssimos e intermináveis trechos de estrada. Eu adoro percursos de estrada, mas no caso do Ironman Florianópolis eles são bem cansativos, planos e repetitivos. Correr em provas de 2 voltas já é um desafio mental, mas 3 voltas, nesta distância, o psicológico tem que aguentar muito bem. Por exemplo, você passa por uma placa e ela marca “14”, alguns metros à frente está outra, “24” e mais alguns, outra “34”. Dá para imaginar?

Eu tinha mais de 7 horas para cumprir o percurso, se fosse andando chegaria ainda no tempo limite, mas não é assim que se faz. Fui no meu trote sem forçar, andando apenas no trecho das subidas nesta primeira parte. Pouco adiante do Km 21 estavam as sacolas de percurso novamente. Parada estratégica, fui ao banheiro químico e parei para tomar mais um analgésico para as costas e trocar as meias. Uma garoa fina já começava a
engrossar, quanto menos atrito nos pés melhor. O pessoal do staff como sempre muito generoso, até ofereceram uma cadeira para eu sentar e fazer a troca!

O que faltava agora eram 2 voltas menores, com aproximadamente 10 Km cada, e já víamos muitos atletas comemorando a última volta em direção à chegada. Incentivo e ao mesmo tempo frustrante, pois ainda estávamos no percurso muito atrás. Andei em alguns trechos mais por tédio do que por desgaste físico. Sim, o psicológico falou mais alto e o cansaço até bateu um pouco, mas faltava menos de 20 Km para o final. Ultrapassei alguns atletas, tentei incentivar e alguns até engataram um pouco a marcha. E a chuva caí fina e às vezes apertava, mas tudo ali era festa.

Pois bem, voltei à área de mansões de Jurerê, e antes da curva final, quando estava meio emparelhado com uma atleta possivelmente estrangeira, ouvi uma moça com uma criança de colo, naquele frio dizer para nós: “gente, vocês não sabem o incentivo que vocês são para nós!”. Só consegui dizer “obrigado, moça, ganhei meu dia!”. E ganhei mesmo, saber que você está ali martelando seu corpo há quase 16 horas e que sua atitude inspira outros, bom, como diria a propaganda, não tem preço.

Passei então o Km 41 da corrida, pouco mais de 1 Km para o fim do meu Ironman e...

Pensou que eu ia terminar a estória aqui? É igual seriado americano, quando fica emocionante, aguarde o próximo episódio...